O cantor e compositor Caetano Veloso, convidado ao centro do programa Roda Viva nesta última segunda (20/12/2021), disse não ver problema no uso da palavra “mulato”, um termo que aparece no recente álbum “Meu Coco”.
Com a calma costumeira, Caetano falou sobre eleições e afirmou “Já estar com Lula” em 2022. Criticou a passividade da imprensa na questão da Lava Jato e declarou que suspeitava da operação, que se mostrava tendenciosa.
“Eu sou um daqueles que acompanharam com respeito mas com suspeição toda a onda da Lava Jato. Mesmo porque ela foi se revelando tendenciosa. O alinhamento político de Moro com Bolsonaro. Ele [o ex-juiz] tem dificuldade de desfazer agora, e merece enfrentar essa dificuldade… é o mínimo”.
Caetano mencionou o fato da recuperação do dinheiro, resultado de ilegalidade nos contratos com a Petrobras, devolvido aos cofres públicos ter causado uma certa euforia da imprensa com relação à operação, mas que ainda permanecem alguns resquícios.
“Houve uma certa euforia da imprensa com relação à Lava Jato. E isso não me anima. A imprensa, naquela altura, foi um pouco passiva demais e pouco crítica”.
O cantor, que apoiou Ciro Gomes (PDT) na campanha à presidência da República em 2018, confirmou que está decidido a votar em Lula em 2022. Perguntado sobre quem terá seu apoio nas eleições do ano que vem, Caetano foi direto: “Eu já estou de Lula, de certa forma, porque as coisas estão assim configuradas. Meu coração está com Lula e Ciro”. Ciro Gomes é pré-candidato pelo PDT.
Caetano Veloso também declarou que não sabia se definir politicamente, mas que estava “à esquerda de mim mesmo”.
Brasil: mais triste que feliz Caetano Veloso não concorda com algumas terminologias utilizadas para falar a respeito da raça. A palavra “mulato” é uma, que costuma ser criticada pelo movimento negro por remeter a mulas, animais incapazes de se reproduzir.
Não é assim que pensa o músico que se define como pardo.
“Tem muita gente que quer definir a terminologia que podemos usar a respeito de raça, eu não sou necessariamente obrigado a concordar”, afirmou, dizendo que isso era uma tendência importada de movimentos americanizados.
“Eu sou antropófago, temos que comer e metabolizar isso, não se deixar dominar por isso. Não vejo o problema de mulato, qual o problema das mulas?”
Ele acrescentou ainda que “a miscigenação virou um mito de beleza brasileira que atrapalha certas estatísticas que precisam ser enfrentadas” e que aprendeu muito com os “movimentos relativos a raça”, essenciais para superar a herança colonial do Brasil.
Caetano também afirmou que a ideia de que o brasileiro é um povo alegre era “relativamente nova” para ele.
“Aprendi desde pequeno que somos a união de três raças tristes”, afirmou. “No mundo intelectualizado em Santo Amaro, essa ideia de que o Brasil era uma espécie de país triste era corrente. Os sambas mais tocados no Carnaval sempre foram histórias de amor que não deram certo.”
O artista disse que “quem inventou essa ideia de Brasil feliz foi o Vinicius de Moraes”, já que a bossa nova, segundo ele, teria feito as primeiras músicas de celebração de amores correspondidos.
E hoje voltamos de novo à sofrência”, disse, rindo, “o que não quer dizer que voltamos para trás.”
Ainda em relação a música, ele comentou que era “meio redundante” discutir a sexualidade fluida para pessoas de sua geração, que cresceu nos anos 1960.
“Os artistas populares, de massa, estavam todos pondo em questão a autodefinição de gênero no gestual, na roupa, no cabelo. Quando eu vi o primeiro show dos Rolling Stones, em que o Mick Jagger chegou com aquela bicharia toda, achei espetacular”, disse. “E eu já tinha feito algo assim nos festivais no Brasil, dançava assim com o quadril parecendo a Luísa Sonza.”
Respondendo a uma pergunta sobre se a burrice tinha saído do armário no Brasil de Bolsonaro, Caetano diz que ela na verdade “pode ter muito a contribuir”.
Comparando a sociedade a um “organismo mental de informação que vai se mexendo”, ele afirmou que não se “pode deixar de passar pelo que a gente chama de burrice”. Só porque o sujeito é lido e intelectualizado, disse ele, “não quer dizer que ele esteja numa posição superior a aqueles que vão vivendo meio sem saber”.
Em outro momento, instado a responder sobre como via a perspectiva da morte, disse que não se fiava à ideia de reencarnação.
“Somos o infinito aprisionado no finito. Sinto mais o impacto do mistério de existir, de ter consciência de que isso é finito, que eu vou acabar. Então o mundo todo vai acabar pra mim, em mim, de mim.”
*** Informações com 👉 Jornal de Brasília
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