Marqueteiro de Moro quer atrair bolsonarista desiludido e tornar ex-juiz menos formal

POLÍTICA

Os primeiros alvos de Sergio Moro (Podemos) na campanha presidencial serão os bolsonaristas desiludidos, diz o publicitário que cuidará de sua candidatura, Pablo Nobel, 56. “Alguns aliados de primeira hora de Bolsonaro, tanto na sociedade como na mídia e mesmo na política, começam a debandar. A pergunta é para onde vão esses votos. Aí há um espaço para a gente trabalhar”, afirma ele, argentino que vive há mais de 40 anos no Brasil.

Anunciado nesta semana, Nobel diz que tem como uma de suas tarefas apresentar um Moro mais informal, sem as amarras que o cargo de juiz exige. “Imagina que esse homem passou todos esses anos sem poder expressar muito as emoções, tendo que passar uma coisa mais séria, imparcial. São atributos de um juiz, mas não necessariamente de um candidato”, afirma.

Juiz da Lava Jato, Moro abandonou a magistratura para assumir o Ministério da Justiça do governo Bolsonaro, com quem se desentendeu –isso motivou seu pedido de demissão em abril de 2020.

Em 2021, Moro sofreu uma dura derrota no STF (Supremo Tribunal Federal), que o considerou parcial nas ações em que atuou como juiz federal contra o ex-presidente Lula (PT). Com isso, foram anuladas ações dos casos tríplex, sítio de Atibaia e Instituto Lula.

Esta será a nona campanha presidencial de Nobel, que já teve clientes do PT ao PSDB, além de trabalhos fora do Brasil. Em geral exerceu a função de diretor de programas, não de marqueteiro, termo que ele rejeita. “Prefiro coordenador”, diz.

PERGUNTA – Que ideias iniciais o sr. tem para a campanha do Moro?
PABLO NOBEL – A campanha neste ano começou muito cedo. Em 2018 a coisa esquentou a partir de junho, julho. Estamos no começo de fevereiro e parece que falta uma semana para a eleição. Estou partindo de um candidato que está sob fogo cerrado, um patrulhamento de grande parte da elite. O fato de ele ter sido um protagonista no processo de colocar corruptos poderosos na cadeia gera emoções muito fortes.
O que percebo é que o quadro está em movimento. Alguns aliados de primeira hora de Bolsonaro, tanto na sociedade como na mídia e mesmo na política, começam a debandar. A pergunta é para onde vão esses votos. Aí há um espaço para a gente trabalhar. É uma avenida? Não. É uma trilha? Mas ele existe.
Em termos mais estratégicos, entendo que votar em Bolsonaro é eleger o Lula. Isso faz com que ele [Moro] se torne um pouco alvo de ambos. Nosso trabalho é de paciência. Não é uma corrida de 100 metros, é uma maratona, e ao longo dela os cenários vão mudar.

O primeiro alvo são os que estão deixando Bolsonaro?
PN – Exatamente. O espectro político do Sergio Moro é esse centro, centro-direita. Por outro lado, é preciso fazer a apresentação dele, desse personagem, desse protagonista, de um outro ponto de vista. O Moro é conhecido, teve muita exposição nos últimos anos, mas no papel de juiz. Vou apresentar agora outro viés. Essa é minha tarefa.

O rompimento do Moro com Bolsonaro foi muito duro, ele foi chamado de traidor. É possível atrair eleitores do Bolsonaro mesmo nesse contexto?
PN – É. Assim como muitos milhões de brasileiros estão decepcionados com Bolsonaro, o Moro é mais um. O Moro sai [do ministério] não porque está arrependido de ter ido. O Moro entra lá porque entende que é a melhor maneira de ajudar o Brasil, transformar alguma coisa. Era a crença dele naquele momento.
Estando lá dentro, percebe que os interesses do Bolsonaro são outros, especialmente no que diz respeito ao Ministério da Justiça. E nesse momento ele diz: ‘não, dessa maneira não, não é para isso que eu vim’. Sai profundamente decepcionado. Há uma identificação empática de Moro com quem votou nele [Bolsonaro] e está decepcionado. É com este brasileiro que eu preciso dialogar.

Nos últimos três anos, Moro sofreu uma série de críticas e derrotas: diálogos vazados, suspeição determinada pelo STF, a polêmica do contrato com a Alvarez & Marsal, além de ter ido para o ministério. Ele deveria fazer algum mea culpa?
PN – Ainda não tenho resposta para isso. Preciso entender melhor essa matéria-prima toda. Construir essa narrativa e entender o que é acerto, o que é erro, o que merece mea culpa ou não. Temos de estudar isso melhor.

Mas o sr. concorda que são pontos fracos dele na campanha?
PN – Não sei ainda avaliar se são pontos fracos, dificuldades ou se podem ser oportunidades também. Campanhas políticas são, antes de mais nada, guerras de narrativas. Como a gente ainda vai construir a narrativa, precisamos entender como essas peças se encaixam. Campanhas não são guerras de argumentos, são guerras de impressões, há uma subjetividade em cada uma dessas coisas que precisa ser avaliada.

O que o sr. achou da live dele em que mostrou quanto ganhou da consultoria? Muitos aliados acharam que foi uma exposição desnecessária.
PN – Achei que foi muito bom. Me parece que trouxe transparência, protagonismo e trouxe muita internet, muito engajamento. E fica nossa provocação para os adversários. A hashtag #AbreAsContasBolsoLula virou trending topic. Então há um interesse nessa transparência, e ele deu o pontapé inicial. Agora queremos que o Lula abra as contas das palestras da Odebrecht e o Bolsonaro, as das rachadinhas.

Suas primeiras peças vão ser mais de apresentação de Moro ou crítica a adversários?
PN – Vai ser um mix. Temos uma campanha a ser construída, apresentando esse outro lado, mais biográfico, do Sergio, não apenas o que as pessoas conhecem via TV como juiz, traduzir isso para o que ele é de verdade. Posicionar ele como candidato. Isso é uma construção, vai acontecer em todas as mídias, vou tentar impor essa marca.

Muita gente tem uma avaliação de que Moro precisa melhorar na forma, no jeito que fala, maneira de se expressar, tem uma imagem muito dura. É uma preocupação?
PN – Quando você está acostumado a ser médico, cria hábitos por ser médico. Imagina que esse homem passou todos esses anos sem poder expressar muito as emoções, tendo que passar uma coisa mais séria, imparcial. São atributos de um juiz, mas não necessariamente de um candidato. Claro que tudo isso vai ser trabalhado.

A ideia é que ele fique um pouco mais informal?
PN – Sim, que ele fique mais informal é uma palavra boa, que ele fique mais próximo das pessoas, que vista esse figurino de candidato, de político, saia um pouco do papel do juiz, que é sempre mais distante.

Combate à corrupção será o mote de campanha?
PN – Não. Não vejo isso do interesse da audiência, do leitor médio. Isso faz parte dele, claro, mas não vem como principal bandeira. Temos coisas muito mais urgentes no Brasil hoje, que conversam mais com as necessidades de seu cotidiano, e é sobre isso que a gente vai precisar se conectar, falar. Economia, Covid, políticas sociais, o que está acontecendo com essa população que sofreu tanto os anos da Dilma [Rousseff] e agora com Bolsonaro. Esse empobrecimento traz questões que não dá para passar ao largo.

Como será feita a crítica ao Lula? É mais difícil ele ser tirado do segundo turno do que o Bolsonaro, não?
PN – Claro. Não tenho nenhuma pretensão de tirar Lula de nada. Seria ingenuidade da nossa parte, fantasia política. Temos dois adversários: um é Lula, por questões ideológicas, práticas, pela história do candidato, e o outro é Bolsonaro, em função do desastre que está acontecendo nesse país. O Bolsonaro está no nosso espectro. O eleitor do Lula não vai mudar de ideia e votar em mim [Moro] agora. Claro que vamos questionar os dois lados, para fazer as pessoas pensarem.

O MBL vai participar da campanha, especialmente em redes sociais?
PN – Estamos conversando e a ideia é trabalhar juntos. Usar o conhecimento grande que eles têm, aderência, engajamento e ir trazendo devagar os conteúdos que a gente achar pertinente.

Seu perfil é de diretor de programas, mas muita gente aponta sua falta de experiência como marqueteiro, estrategista. O que acha disso?
PN – Eu prefiro a palavra coordenador. Há uma mitificação sobre a genialidade dos marqueteiros da outra geração, de tirar um coelho da cartola. Eu já faço parte de outra geração. Meu trabalho é de equipe. Apesar de minha especialidade ser todo esse trabalho de imagem etc., eu estou sentado na mesa com as principais cabeças há muitos anos, a gente discute de estratégia até roteiros, a forma de a pessoa se apresentar.

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