BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Congresso derrubou nesta quinta-feira (10/03/2022) o veto do presidente Jair Bolsonaro (PL) à política de distribuição de absorventes para mulheres em situação de vulnerabilidade e estudantes de baixa renda.
A derrubada ocorreu dois dias após o presidente assinar decreto que prevê a distribuição gratuita de absorventes, em uma tentativa de diminuir sua rejeição junto às mulheres, no ano em que buscará se reeleger.
Na Câmara, o veto foi rejeitado por 426 a 25. No Senado, o placar foi de 64 a 1. A derrubada do veto só ocorre por decisão da maioria absoluta de deputados (no mínimo, 257) e senadores (ao menos 41). Quando não há esse quórum mínimo em uma das Casas, o veto é mantido.
Mesmo com o decreto, o Congresso manteve a decisão de rejeitar o veto de Bolsonaro. Um dos motivos apontados foi a maior abrangência da lei, que, na avaliação de parlamentares, contemplaria ao menos três milhões de mulheres a mais que a medida editada pelo chefe do Executivo.
“A derrubada desse veto fez parte de uma grande articulação dentro do Congresso”, disse, em nota, uma das autoras do projeto, a deputada Marília Arraes (PT-PE). “Foi uma vitória das mulheres brasileiras, que terão mais dignidade a partir de agora. Nossa luta continua. Agora é cobrar a imediata regulamentação e o início efetivo do programa”.
A deputada chamou o decreto de Bolsonaro de eleitoreiro. “Menciona programas, publicidade, mas não diz exatamente que mulheres serão beneficiadas, não diz de onde sairá o recurso, mas diz que o programa não vai existir se não tiver recurso. Ou seja, não diz nada”, afirmou.
Em outubro, Câmara e Senado aprovaram projeto de lei, de autoria de 35 deputadas, criando o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual.
O projeto de lei prevê como beneficiárias do programa estudantes de baixa renda de escolas públicas, mulheres em situação de rua ou em vulnerabilidade social extrema, mulheres apreendidas e presidiárias e mulheres internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa.
Segundo os autores, o programa beneficiará cerca de 5,6 milhões de mulheres. A estimativa de impacto fiscal era de R$ 84,5 milhões por ano, recursos que sairiam do SUS (Sistema Único de Saúde) e do fundo penitenciário, no caso das detentas.
Bolsonaro sancionou a proposta, mas vetou a sua principal medida: a distribuição dos absorventes para mulheres de baixa renda e em situação de vulnerabilidade.
Ao vetar o programa, o governo federal argumentou que a proposta contrariava o interesse público, “uma vez que não há compatibilidade com a autonomia das redes e estabelecimentos de ensino. Ademais, não indica a fonte de custeio ou medida compensatória, em violação ao disposto”, afirma a justificativa ao veto.
Em live logo após vetar a medida, o presidente ironizou a reação à sua decisão. “A gente vai se virar e vamos aí estender o ‘auxílio Modess’ –é isso mesmo, ‘auxílio Modess’, absorvente?– para todo mundo”, disse o presidente, em referência à marca do produto.
“Se o Congresso derrubar o veto –estou torcendo para que derrube–, eu vou arranjar absorvente. Porque não vai ser gratuito, pessoal. Calcularam aqui um pouco mais de R$ 100 milhões. Pode ter certeza, vai multiplicar por três isso daí, vou ter que arranjar R$ 300 milhões de algum lugar. Eu não vou criar imposto para suprir isso aí, nem majorar imposto. Eu vou tirar de algum lugar. Agora a imprensa vai bater em mim que ‘[Bolsonaro] cortou da Saúde, da Educação’, [mas] não vai dizer para onde foi. Vai ser para atender a derrubada do veto dos absorventes”.
Na última terça-feira (8), em cerimônia de homenagem ao Dia da Mulher no Palácio do Planalto, Bolsonaro editou o decreto prevendo a distribuição gratuita de absorventes.
No evento, Bolsonaro disse que a mulher está “praticamente integrada” à sociedade. “Minha mãe foi também uma empreendedora. Lá naquele meu tempo, é história, ou a mulher era professora ou dona de casa, dificilmente uma mulher fazia algo diferente disso. Lá nos anos 1950, 1960. Hoje em dia as mulheres estão praticamente integradas à sociedade. Nós as auxiliamos. Nós estamos sempre ao lado dela. Não podemos mais viver sem ela”, afirmou.
O texto diz que o objetivo é combater a precariedade menstrual, ou seja, a falta de acesso a produtos de higiene e a outros itens necessários durante a menstruação ou a falta de recursos que possibilitem a sua aquisição.
Além disso, prevê garantia de cuidados básicos de saúde e o desenvolvimento de meios para a inclusão das mulheres em ações e programas de proteção à saúde menstrual.
De acordo com o decreto, ficará a cargo do Ministério da Justiça e Segurança Pública implementar projetos, programas e ações voltadas à disponibilização de absorventes para presas. Já o MEC (Ministério da Educação) deverá promover, em colaboração com estados e municípios, campanha informativa nas escolas da rede pública de ensino sobre a saúde menstrual e as suas consequências para a saúde da mulher.
O decreto estabelece que a execução do Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual ficará condicionada à disponibilidade orçamentária e financeira.
Na terça, o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e o secretário de Atenção Primária, Raphael Câmara, disseram a jornalistas que o decreto incluiria a previsão de R$ 130 milhões do orçamento do Ministério da Saúde, e contemplaria 3,6 milhões de mulheres.
Levantamento do jornal Folha de S.Paulo mostrou que apenas duas capitais, São Paulo e Curitiba, além do Distrito Federal, realizam a distribuição do absorvente para a população de rua de forma ampla.
O restante das capitais realiza a distribuição só nos centros de acolhimento ou então nem possui políticas relacionadas ao problema da pobreza menstrual. Há ainda três capitais, Boa Vista, Natal e Porto Velho, que possuem um projeto aprovado, mas que ainda não está em vigor.
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