André Borges (Agência Estado) – Três partidos políticos deram entrada em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal contra a lei federal 14.299, que prorroga até 2040 os subsídios ao carvão mineral para a geração de energia elétrica.
Na ação contra a lei editada em janeiro, PSOL, Rede e PSB afirmam que, ao garantir financiamento público ao mais poluente dos combustíveis fósseis na geração de energia, o governo distorce o conceito de “transição energética justa”, ignorando a necessidade de haver abatimento de carbono na geração nacional e contribuindo para a emissão de grande volume de gases de efeito estufa.
Segundo as legendas, a lei beneficia o Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, conjunto de usinas na cidade de Capivari de Baixo, em Santa Catarina.
A ação é apoiada pelo Observatório do Clima e pelo Observatório do Carvão Mineral, o Instituto Arayara entrou como “amicus curiae” dos partidos no STF. “Precisamos de uma transição energética justa que considere todo conjunto da sociedade, diversas formas de geração de energia e não manter o subsídio para o carvão continuar comprometendo a nossa sustentabilidade, prejudicando a saúde da nossa população e transformando o nosso país num pária internacional”, afirma o presidente do PSB, Carlos Siqueira.
André Maimoni, assessor jurídico do Psol, diz que o setor de geração de energia não pode mais se basear em medidas ecologicamente injustificáveis, que degradam o meio ambiente e que prejudicam a saúde das populações. “Daí a necessidade de intervenção judicial do Supremo para que vede o estímulo do uso do carvão, que está sendo subvencionado com dinheiro público para gerar energia poluente”, diz.
O porta-voz da Rede Sustentabilidade, Wesley Diogenes, afirmou que a decisão de prorrogar até pelo menos 2040 a utilização do carvão e de termelétricas “institucionaliza uma política socioambiental catastrófica e é cúmplice das mudanças climáticas”. No lugar de pensar uma estratégia de transição energética justa, disse Diogenes, que foque na capacitação de pessoas e geração de empregos por meio de fontes sustentáveis de energia, “a política adotada insiste em uma tecnologia obsoleta, que conhecidamente causa inúmeros prejuízos aos consumidores, ao meio ambiente e a saúde pública”.
A reportagem questionou o Ministério de Minas e Energia sobre o assunto. Não houve resposta até a publicação deste texto.
“Esta ação vem no sentido de estancar a torneira de subsídios para uma fonte de energia que tem trazido prejuízos para o planeta, para as pessoas, para o Estado e para a economia”, disse o diretor do Instituto Arayara, Juliano Bueno de Araújo.
O complexo Jorge Lacerda, que tem oito termelétricas, torna Capivari de Baixo, um município de apenas 25 mil habitantes, o maior emissor de gases de efeito estufa por metro quadrado do Brasil.
A ação questiona ainda a comprovada ineficiência do subsídio ao carvão ao longo do tempo. De acordo com análise feita pelo Tribunal de Contas da União em 2019, o incentivo vai em sentido contrário à tendência de abandono da matriz energética fóssil, criando uma grande distorção na concorrência do setor energético, além de ter sérios problemas de transparência.
A ADI aponta que a lei ainda viola normas internacionais, como o Acordo de Paris, e o regime jurídico de proteção ao meio ambiente. A prorrogação de autorização e a garantia de contratação direta de energia elétrica gerada pelo Complexo Termelétrico Jorge Lacerda, na modalidade de energia de reserva, viola também o princípio da impessoalidade, disposto na Constituição Federal. “O Brasil, que não precisa de carvão, está dando uma sobrevida inexplicável a esse combustível, daí a impugnação da nova lei”, diz Nauê Pinheiro de Azevedo, assessor jurídico do Observatório do Clima.
O plano do governo Bolsonaro de renovar o atual parque de usinas térmicas de carvão mineral do País, fonte reconhecida como uma das mais poluentes da matriz elétrica, prevê a injeção de R$ 20 bilhões nessas operações nos próximos dez anos. A questão é saber de onde sairá o dinheiro para financiar um negócio que tem encolhido em todo o mundo devido à urgência na redução de emissões de gases de efeito estufa. O BNDES, principal banco estatal de apoio e financiamento ao setor elétrico, está fora dessa aposta, diz que só apoia energia limpa e que, até segunda ordem, não pretende colocar nenhum centavo naquele que é um dos principais programas energéticos do governo federal.
A última usina a carvão mineral financiada pelo BNDES, ou seja, com recurso público, foi em 2015. No ano seguinte, o banco resolveu vetar repasses para esse tipo de projeto. Neste ano, o posicionamento foi formalmente definido pela diretoria do banco, para apostar em projetos menos poluentes de geração de energia. Nos últimos cinco anos, o BNDES firmou contratos de R$ 27 bilhões em financiamentos a projetos de geração com fontes hídricas, solares, eólicas e de biomassa. Outros 12 projetos de térmicas a gás receberam R$ 7,7 bilhões no mesmo período.
Hoje, 100% da estrutura de geração a carvão no País está limitada a sete usinas (uma no Paraná, duas no Rio Grande do Sul e quatro em Santa Catarina). Juntas, essas usinas somam uma capacidade instalada de 1.572 megawatts médios, energia suficiente para abastecer boa parte da Região Sul.
*** Informações com 👉 Agência Brasil
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