Qual será o impacto do voto dos eleitores de 16 e 17 anos nas eleições de outubro? Entenda a manchete.

POLÍTICA

Marina Lang (Agência Sputnik Brasil) – Em um ritmo entusiasmado e frenético, celebridades como a cantora Anitta e os atores Leonardo DiCaprio, Mark Ruffalo e Mark Hamill fizeram uma campanha bem brasileira para seus milhões de seguidores nas redes sociais nas últimas semanas.

Eles não pediram votos para nenhum candidato em especial, mas sim que os jovens, particularmente os da faixa etária de 16 a 17 anos, tirassem seus títulos para participar das eleições do Brasil, em outubro — pleito que será decisivo para o futuro do país.

Em outras nações, a participação dos jovens foi considerada fundamental para as eleições majoritárias.

No Brasil, no caso dos adolescentes de 16 e 17 anos, o voto é facultativo.

Veio daí, portanto, a campanha encabeçada por ativistas e celebridades.

A intensa mobilização, porém, suscita algumas questões. Qual será o impacto do registro do título de eleitor por parte dos mais jovens nas eleições, sobretudo na escolha presidencial em um cenário tão dividido?

Baixa adesão, mas até o fim do dia, tudo pode mudar

Nas últimas eleições presidenciais, realizadas em 2018, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contabilizava cerca de 1,8 milhão de adolescentes de 16 e 17 anos com título eleitoral no mês de abril. Em 2022, até o mês passado havia por volta de 1,6 milhão de jovens dessa faixa etária, uma ligeira redução.

Na quarta-feira (4), o TSE informou que os tribunais regionais eleitorais receberam mais de 7,2 milhões de pedidos nos últimos 30 dias — um recorde de atendimentos, segundo informou o tribunal.

Mesmo assim, analistas ouvidos pela Sputnik Brasil dizem que é difícil (e até mesmo imprevisível) uma mudança no cenário da votação a partir de uma eventual adesão maciça do jovem eleitorado.

Para Creomar de Souza, fundador e CEO da consultoria de análise de risco político Dharma, há duas percepções no espírito do tempo contemporâneo brasileiro. “A primeira delas é aquela que parte de um princípio, bastante entusiástico, de que o voto dos jovens tende a resolver de um lado ou de outro [a polarização política]. A outra é que, apesar de todo esse engajamento, a adesão dos jovens em termos quantitativos ainda é muito baixa. Do ponto de vista dos militantes, tem-se a crença de que todos os jovens vão votar em um determinado candidato. Mas o problema em termos práticos é que não temos controle sobre isso. Lembrando que o exercício de voto é o exercício de crença em determinado tipo de olhar sobre a realidade”, analisa.

Souza avalia ainda que seria bastante excessivo colocar nas costas dos jovens a responsabilidade pela decisão eleitoral. “Com os dados que nós temos levantados na consultoria até aqui, o fiel da balança será o comparecimento”, diz.

Ou seja, o candidato que melhor conseguir transmitir a mensagem de que sua proposição atende efetivamente aos interesses da maior parte do público será o mais bem-sucedido.

O CEO entende que, da mesma forma que há um clamor pelo registro do voto dos jovens, há o clamor para que idosos votem. Esse equilíbrio na balança eleitoral mostra duas questões importantes.

“A primeira é que esta eleição está marcada por uma lógica de plebiscito. E a segunda, daí derivada, é o fato de que essa lógica plebiscitária tem um componente muito forte de rejeição: a eleição está se construindo em um raciocínio de que há os que rejeitam o candidato ‘A’ disputando contra aqueles que rejeitam o ‘B’. É a tônica do debate no momento”, indica.

Sem inclinações diferentes no atual cenário eleitoral

Já Paulo D’Ávila, cientista político e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), avalia que a participação de adolescentes aptos a votar terá um impacto baixo. Ele aponta que, segundo pesquisas, o eleitorado brasileiro envelheceu.

Hoje há uma transição na qual a maior parte do eleitorado está na faixa dos 55 a 60 anos. Logo, o baixo impacto está ligado ao perfil da distribuição populacional.

“O que as pesquisas apontam até agora é que esse eleitorado jovem entra no jogo distribuindo suas preferências tal como o perfil do eleitorado de maneira geral. A última pesquisa aponta 47% de preferência [da faixa etária entre 16 e 24 anos] para o Lula e 30% para o Bolsonaro, e na população de um modo geral está 46% para 31%. Então eles se distribuem de acordo com a preferência do eleitorado, não há uma inclinação diferente”, observa D’Ávila.

Ele acrescenta que as pesquisas ainda não mensuraram o que o jovem eleitor busca no candidato, algo que é produzido a partir de pesquisas qualitativas, sobretudo do método que consiste em avaliar grupos focais.

Porém é preciso observar a distribuição da avaliação do governo de Jair Bolsonaro (PL) entre os jovens de 16 a 24 anos, que é similar a das outras faixas: 48% acham que é péssimo, 29% acham que é regular e 22% acham que é bom. É uma base que está muito próximo da avaliação geral do governo, de acordo com o professor da UERJ.

D’ávila também aponta que o jovem eleitorado costuma se espelhar no voto dos familiares, que são responsáveis pelo princípio da formação social e intelectual deles.

“A experiência que eu tenho de magistério, na relação entre professor e aluno e na experiência de pesquisa, é que a preferência desse jovem acompanha a preferência do ambiente familiar, que pesa bastante na formação inicial desse jovem. Então não vejo muito impacto em termos de preferência e de resultado eleitoral, ainda que tenhamos eleições competitivas e polarizadas, que costumam atrair mais eleitores”, indica.

Por outro lado, ele entende que as campanhas feitas pelas celebridades carregam uma importância simbólica grande, embora talvez não haja um impacto decisório. Isso porque esses jovens são os eleitores maduros de amanhã. Mas por ora esses jovens consomem pouca informação política, assim como os adultos, diz. Os veículos mais consumidos são Internet (na faixa etária mais nova) e TV (principalmente entre os mais velhos).

“Se na internet a qualidade da informação é duvidosa, na televisão o tempo dedicado ao debate político é pequeno, sobretudo na TV aberta. Temos um eleitorado que consome pouca informação política — e a informação política que consome tem qualidade duvidosa, que se dedica pouco a uma análise mais minuciosa do debate público. É assim com o eleitorado geral e é assim com os jovens, que consomem informação de um jeito parecido com os mais velhos”, estima D’Ávila.

Há esperança?

Para Souza, a baixa adesão dos jovens ao pleito indica que esses indivíduos enxergam os processos da sua inserção política sendo negligenciados. Isso tem sido colocado como um dos dilemas que afastam a juventude das eleições, que dão a sensação de que os políticos não representam esse grupo especificamente.

“O que os principais candidatos vão dizer para esses públicos? O que eles de fato têm capacidade de entregar? Nesse aspecto, um elemento que pode ser surpreendente em outubro, em relação ao voto dos mais jovens, é entender que tão importante quanto a mensagem a ser entregue é a plataforma de entrega dessa mensagem. Ou seja, o jovem quer emprego, quer renda, mas que isso seja entregue e envelopado em uma mensagem que ele compreenda”, sugere.

O professor da Uerj, por sua vez, lembra que um aspecto importante do jovem que está tirando o título é que ele passa a ficar mais interessado em informação política. Isso amplia a percepção de mundo para além do entorno familiar, na visão dele.

“A partir daí ele quer conversar com colegas, com professores, com as pessoas que ele confia no entorno, e vai consumir informação para além da bolha familiar, em algum veículo de informação, porque é portador do título. Então a campanha é fundamental para a formação desse eleitor para o exercício de votar”, conclui.


*** Informações com ➡ Agência Sputnik Brasil

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