“Tenho absoluta certeza que isso vai acabar em nada. Um inquérito que tem cinco anos e meio de fatos de dez anos atrás? O que existe é a vontade de quebrar a pessoa”, disse o juiz federal Augustino Lima Chaves, em entrevista ao O POVO. Ele é um dos 19 alvos da operação Skiagraphia, realizada pela Polícia Federal na manhã desta sexta-feira, 20 de maio de 2022. Com sigilo decretado, a investigação da PF apura esquema de corrupção, com cifras bilionárias, envolvendo decisões de dívidas fiscais cobradas pela União.
A operação da PF mirou os dois magistrados, advogados, empresários e servidores públicos. O suposto esquema de corrupção envolveria cifras bilionárias, a partir das decisões de dívidas fiscais cobradas pela União. O POVO apurou que uma das empresas cobradas teria conseguido, dentro de um processo fiscal, substituir imóveis penhorados de maior valor por outros menos valiosos.
Teria sido uma das manobras para reduzir débitos milionários — que acumulados chegariam à casa do bilhão de reais. Na entrevista coletiva à imprensa sobre a operação, a PF descreveu que a empresa cearense é da área de mineração, mas não divulgou nenhum dos nomes dentro do caso.
Hoje atuando em Brasília como assessor da presidência do STJ, Chaves acusou a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) de “negligenciar” processos que teriam permanecido sem andamento por vários anos, e que ele teria reaberto quando assumiu a 20ª Vara. Isso teria causado “uma reação”, nas palavras dele. “Quando fui mexer nesses processos comecei a ouvir reação. Mas esses processos, pelo contrário, que causou prejuízo à Fazenda Nacional foi quem atuava como procurador da Fazenda Nacional, não eu. Fui reagir a uma situação quando cheguei na Vara (20ª Federal). Estão invertendo as coisas.”
A PF confirmou que foi uma notícia gerada pela PGFN que deu início às investigações. Ele acusa que “o objetivo de uma operação dessa é desmoralizar, não é encontrar prova. É desmoralizar, tentar acabar com a reputação da pessoa”. Os fatos investigados são do período entre 2012 e 2016, quando ele ainda estava no Ceará.
Os 19 mandados expedidos pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) foram todos de busca e apreensão, cumpridos em Fortaleza, São Paulo, Brasília, Recife e Dourados (MS). O POVO tentou contato com o escritório do juiz aposentado José Parente Pinheiro, mas não teve sucesso nas ligações. Também ligou para o grupo empresarial que teria se beneficiado do esquema, mas também não obteve sucesso. A matéria será atualizada quando houver posicionamento.
Leia entrevista com o juiz Augustino Lima Chaves:
O POVO – O que o senhor tem a dizer sobre essa operação da Polícia Federal?
Augustino Lima Chaves – Queria dizer duas coisas. Eles dizem que são fatos de 2012 a 2016. Então são fatos extemporâneos, jamais iriam autorizar busca e apreensão sobre 2012 a 2016. Esse inquérito tem mais de cinco anos, eu nunca fui ouvido. É uma narrativa unilateral, eu nunca fui ouvido nesse inquérito. Nenhuma decisão minha foi reformada pelo Tribunal, foram todas confirmadas. É um processo muito antigo. Dois processos desses (alvos da investigação) tinham mais de 20 anos. Estavam parados por irresponsabilidade e negligência da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Quando fui mexer nesses processos comecei a ouvir reação. Mas esses processos, pelo contrário, que causou prejuízo à Fazenda Nacional foi quem atuava como procurador da Fazenda Nacional, não eu. Fui reagir a uma situação quando cheguei na Vara (20ª Federal). Estão invertendo as coisas. Eles estão se defendendo, invertendo e transferindo a culpa pra mim. Mas se forem examinar os autos, a negligência é da Procuradoria da Fazenda Nacional.
OP – Os processos são de quais empresas?
Augustino – Eu não lembro o nome das empresas. Eu sei quais são os processos, mas não lembro o nome das empresas.
OP – São quantos processos?
Augustino – Três, quatro ou cinco, realmente não sei. Porque não fui intimado. E não atribuem só a mim. Atribuem a mim e ao colega anterior a mim.
OP – O senhor confirmaria o nome do juiz aposentado?
Augustino – Eu não [vou] citar nomes. (Ele inicialmente não quis confirmar o nome do juiz que o antecedia na 20ª Vara Federal) Eu quero que eles apontem fato, da apelação, do recurso que o Tribunal (TRF-5) tenha contra mim. Minimamente contra mim. Não tem isso. Não existe, não existe. É um processo que qualquer escritório de advocacia do interior do Ceará teria tido melhores resultados que a Procuradoria da Fazenda Nacional. Eu não tô sugerindo envolvimento de corrupção na Procuradoria da Fazenda Nacional. Quero dizer objetivamente que foi um processo mal conduzido pela PGFN. Quando eu fui mexer neles tive a reação.
OP – O senhor sabia que essa investigação estava em andamento?
Augustino – Nunca fui intimado dessa investigação.
OP – Mas o senhor sabia que ele estava em andamento?
Augustino – Depois de cinco anos nunca fui intimado. Depois de cinco anos vem uma decisão extemporânea. Uma busca e apreensão depois de seis a dez anos? Tá entendendo? Recentemente o TRF-5 anulou a busca e apreensão do Ciro (Gomes, pré-candidato à Presidência) por considerar extemporânea. Depois de dois meses, vem uma busca e apreensão. Foi só um desembargador do Tribunal, uma pessoa.
OP – O senhor atribui o quê a essa operação?
Augustino – Eu não vou dizer, não vou dizer. Mas está um clima no Brasil em que qualquer um, qualquer pessoa, está exposta. Você, eu, qualquer um. Se tiver posições firmes, está exposta. Como aconteceu com o Ciro, com o Cid (Gomes, ex-governador), presidente Lula, (ex-presidente Michel) Temer, André Esteves (banqueiro), Wesley e Joesley Batista (empresários).
OP – O senhor considera que o caso pode respingar dentro do gabinete da presidência do STJ?
Augustino – Não, acho que não respinga. Mas foi realizado num momento em que a presidência está acabando (o período da gestão no STJ). Esse inquérito tem cinco anos e meio por fatos que são de seis a dez anos. Por que agora?
OP – O que recolheram do senhor nas apreensões?
Augustino – De mim, nada. Estou no Rio de Janeiro, vim participar de um encontro nacional, não recolheram nada.
OP – Mas da sua casa e no seu escritório, o que levaram?
Augustino – Não tenho escritório, meu computador fica no STJ. Está lá.
OP – Mas recolheram de lá?
Augustino – Não, não recolheram. E meu celular estou aqui falando com ele.
OP – Mas não levaram nada seu, material, papel, nada?
Augustino – Parece que levaram meia dúzia de papel lá, não sei nem qual é.
OP – Da sua casa em Brasília?
Augustino – Eles começaram a olhar os livros, mas como tenho muito livro aí mudaram o tema, se eu tinha algum documento.
OP – Foi na sua casa em Brasília ou no Ceará?
Augustino – Olha, Cláudio, o objetivo de uma operação dessa é desmoralizar, não é encontrar prova. Encontrar prova depois de dez anos? O objetivo é desmoralizar. É tentar acabar com a reputação da pessoa. Eu sempre fui uma pessoa forte e um juiz forte, sempre dei minhas opiniões. E é a questão da democracia no Brasil.
OP – Mas o material apreendido foi na sua casa em Brasília ou no Ceará?
Augustino – Foi em Brasília. Eu hoje moro em Brasília.
OP – O senhor está em Brasília há dois anos?
Augustino – Isso.
OP – Como o senhor vai tentar reverter essa situação?
Augustino – Tenho absoluta certeza que isso vai acabar em nada. Um inquérito que tem cinco anos e meio de fatos de dez anos atrás? Não existe, porque não foi encontrado nada, não existe nada. O que existe é a vontade de quebrar a pessoa.
OP – O outro juiz investigado seria o juiz federal aposentado José Parente Pinheiro?
Augustino – Sim.
OP – O senhor chegou a falar com ele hoje?
Augustino – Não, não cheguei a falar com ele ainda hoje. Ele é aposentado há muito tempo (cerca de dez anos). Ou seja, falta segurança jurídica no Brasil. Isso reflete nas pessoas, na economia, nos investimentos. Eu me dou bem com ele mas não tenho relação com ele.
*** Informações com ➡ Jornal O Povo
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