Durou pouco e acabou às vésperas do 2º turno (30 de outubro) a mágica das canetadas para reduzir a inflação da energia elétrica, comunicações e dos combustíveis, sobretudo a da gasolina. De acordo com o IBGE, o IPCA-15, que funciona como a prévia do IPCA cheio de outubro, que o IBGE vai divulgar dia 10 de novembro, depois de dois meses de queda (-0,73% em agosto e -0,37% em setembro), apurado entre os dias 15 de setembro e 13 de outubro, voltou a subir 0,16%.
A alta foi puxada pelo aumento de 0,21% no item Alimentação e Bebidas, e as subidas de 0,28% em Habitação, de 1,43% em Vestuário e de 0,80% em Saúde e Cuidados Pessoais (devido ao impacto de 1,44% na apropriação mensal do reajuste anual de 15,50% nos Planos de Saúde). Esses impactos não foram compensados pelas baixas de 0,64% em Transportes (só a gasolina caiu 5,92%, contribuindo por baixa geral de 0,29 ponto percentual entre os 367 itens pesquisados pelo IBGE) e de 0,42% em Comunicações. As despesas pessoais aumentaram 0,57% e a Educação, 0,19%, sendo compensadas pela queda de 0,35% nos preços de artigos de residência, que tinham subido muito este ano.
Impactos da guerra
Mas o foco da atuação do governo sobre energia e combustíveis, sobretudo em gasolina, o item de maior peso no cálculo da inflação oficial (IPCA, que mede as despesas das famílias com rende até 40 salários mínimos – R$ 48.480), é claramente avaliado numa tabela demonstrativa do IBGE com a variação acumulada dos preços em 2022, a cada três meses.
É nítido o impacto da alta dos combustíveis e artigos importados, após a invasão da Ucrânia para Rússia, em 28 de fevereiro, seguida das sanções dos Estados Unidos e os demais países membros da Otan à Rússia de Vladimir Putin. Com a forte alta do petróleo e dos derivados, a Petrobras fez reajustes pesados em março e maio, que desagradaram ao presidente Jair Bolsonaro. O diagnóstico era de que os aumentos sepultariam suas chances de reeleição. A alta de 11 de maio gerou reação enérgica: o ministro das Minas e Energia, o almirante Bento Albuquerque foi demitido e para o seu lugar, o ministro da Economia, Paulo Guedes, indicou seu ex-chefe da Secretaria de Política Econômica, Adolfo Sachsida, especialista em inflação.
Sachsida identificou com Guedes que preciso derrubar a inflação que permanecia em dois dígitos desde setembro do ano passado e escalara para 12% em abril, mediante canetadas nos preços da energia, das comunicações e combustíveis, em especial a gasolina (isso foi feito em julho com redução temporária – até 31 de dezembro – do ICMS cobrado pelos estados e repassados aos municípios), bem como de impostos federais.
Estratégia eleitoral
O próximo passo foi trocar a direção da Petrobras, o que se consumou em fins de junho. Faltava então amarrar o pacote de benesses eleitorais temporárias com aprovação do Congresso para redução de impostos (alegou-se um estado de emergência) o governo aproveitou o forte aumento da arrecadação derivada da alta inflação, alimentada pelos preços dos combustíveis e da energia (muito acima da expansão da economia), para fazer transferências bilionárias a setores da sociedade, visando alterar o cenário eleitoral.
Assim, o Auxílio Brasil foi aumentado para R$ 600 até dezembro e criadas mesadas de R$ 1 mil a caminhoneiros autônomos e taxistas. As duas categorias já tinham sido beneficiadas por reduções de impostos e preços dos combustíveis. Mas, repetindo grandes empresários que reforçam suas margens quando o governo baixa impostos, não repassaram os ganhos para as tarifas.
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De qualquer forma, houve baixas significativas de preços nos meses de julho, agosto e setembro no IPCA. E o IPCA-15, que guarda defasagem média de 15 dias, antecipou o processo: após alta de 0,69% em junho (0,59% em maio) o IPCA-15, já impactado pelas baixas na primeira quinzena, subiu apenas 0,13% em julho, e caiu 0,73% em agosto e 0,37% em setembro. O cenário poderia prosseguir em outubro. Mas o agravamento da guerra na Ucrânia, provocou novas altas do petróleo e dos combustíveis e reduziu a margem de manobra da Petrobras para baixas adicionais na gasolina desde o final de setembro.
A pressão altista dos produtos que ficaram de fora do pacote de benesses do governo cortou o impacto positivo da deflação já no IPCA-15, com novo aumento de 0,16%, fazendo a taxa acumulada do ano voltar a subir. No acumulado de 12 meses a queda continua pois os números do final do ano passado foram muito altos (o IPCA-15 subiu 1,20% em outubro de 2021).
Mas é nítido o impacto das canetadas eleitoreiras na redução do ritmo trimestral da inflação, medida pelo IPCA. Após subir 3,71% nos três meses terminados em abril, a variação baixa para 3,30% em maio e para 3,04% em junho, quando começam as reduções oficiais. O grande tombo vem em julho, com taxa acumulada de 1,42%. Agosto já registra variação de apenas 0,08% nos últimos três meses. Setembro tem deflação de 0,97%, mas em outubro os efeitos cessam e a deflação trimestral encolhe para 0,94%.
Marcha desigual dos preços
Todos sabem que os índices de inflação espelham a média de preços. O IPCA capta gastos das famílias com renda até 40 SM (R$ 48.480) e o INPC, os gastos até 5 SM (R$ 6.060|). Mas os perfis de gastos de duas famílias de um mesmo condomínio e com renda assemelhada diferem entre si. Cada um tem seu próprio índice de inflação. Para uns planos de saúde e os remédios pesam muito; para outros, o combustível do veículo gera muitas despesas. Mas o que pesa mesmo é a alimentação. Que está subindo mais que o dobro da inflação.
E o efeito do pacote foi mais benéfico para as famílias de alta renda do que para as que ganham até dois salários mínimos (a maior concentração dos eleitores). Assim, enquanto o transporte público encareceu 11,68% de janeiro a outubro e 14,29%, os preços dos combustíveis automotivos caíram 26,54% de janeiro a outubro e 18,97% nos últimos 12 meses. Isso explica porque Bolsonaro não avança entre os mais pobres.
No IPCA-15 de outubro dá para ver como a inflação está desigual.
O golpe de Guedes no mínimo
Na última revisão de metas do Orçamento Geral da União em 2023, em 15 de setembro, o Ministério da Economia previu que o IPCA subiria 6,30% este ano e 4,50% no ano que vem. O INPC, que reajusta o salário mínimo, subiria 6,54% este ano. Na ocasião, o ME reviu de 2,5% para 2,7% o crescimento do PIB para este ano e manteve a aposta de alta de 2,5% em 2023.
As metas devem ser revistas logo após a eleição, pois a inflação está caindo. A última projeção do mercado na Pesquisa Focus do Banco Central aponta 5,60% para o IPCA deste ano e de 4,94% em 2023. Quando ao PIB, o mercado vê alta até maior – de 2,76% a 2,78%. Mas para 2023, diante da desaceleração neste último trimestre, pela perda de fôlego das medidas eleitoreiras, que anteciparam para 2022 o dinamismo que ia se espalhar no 1º semestre de 2023, espera-se desaceleração do PIB à faixa de 0,63% a 0,70%.
O Ministério previa um reajuste de 6,54% do INPC. Com a revisão da meta do INPC deste ano para 5,70% ou 5,80%, qualquer reajuste do salário mínimo que fique abaixo de 8% em 1º de janeiro de 2023, estará cortando a distribuição à sociedade do crescimento robusto do PIB. A regra clássica é de aumento do mínimo pela atualização monetária, mais a variação do PIB. Se o PIB crescer 2,70%, o reajuste deveria ser de 8,40% a 8,505 (com INPC de 5,80%).
A intenção de Paulo Guedes de desindexar o salário mínimo da inflação, depois corrigida (pelo estrago na campanha da reeleição de Bolsonaro) para “será mantido o ganho real dos salários), não garante muita coisa. Se a inflação for de 5,80% e reajuste de 6,50%, na prática, seria ignorada a taxa de variação do PIB. Ou seria o reconhecimento da maquiagem eleitoral do PIB?
*** Informações com ➡ FOLHA DE S.PAULO via JORNAL DO BRASIL
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