O projeto de lei que busca regulamentar as redes sociais no Brasil levou a um embate entre algumas das principais forças políticas, jurídicas, empresariais e religiosas do Brasil, cenário explicitado nesta terça-feira (2/05/2023). O projeto estava previsto para ser votado nesta terça, mas foi adiado diante da falta de apoios necessários.
De um lado, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se mobilizou de vez a favor da aprovação do chamado PL das Fake News, operação comandada na Câmara pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), antigo defensor da medida.
Parlamentares também relataram, em caráter reservado, uma pressão de bastidores vinda do STF (Supremo Tribunal Federal). Nesta terça, o ministro Alexandre de Moraes determinou que a Polícia Federal tome depoimentos dos “presidentes ou equivalentes” das big techs no prazo de cinco dias sobre ofensiva feita por essas empresas contra o PL.
Do lado oposto ao projeto estão os bolsonaristas, a maioria da bancada evangélica e as grandes empresas de tecnologia. Alguns críticos apelidaram o texto de “PL da censura”.
O primeiro ato de relevo de terça coube a Lira e Lula, que se reuniram a sós no Palácio da Alvorada, o que resultou posteriormente em reuniões da articulação política do governo.
Parlamentares governistas em geral reclamam principalmente no atraso da liberação de emendas, principal meio de negociação entre governo e Legislativo.
Em particular, Lira se ressente pela perda de poder de manejo de votos na Câmara via distribuição e liberação da verba, papel que cumpriu na gestão Jair Bolsonaro (PL).
Em entrevista o jornal O Globo, ele afirmou que Lula deveria retomar o modelo de conseguir maioria no Congresso por meio das emendas e não só da distribuição de ministérios e cargos aos partidos aliados.
Após o encontro com Lula, Lira partiu para a missão de contar voto a voto nas bancadas qual seria o apoio ao projeto de lei.
No governo, além das reuniões da articulação política após o encontro Lira-Lula, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB), chamou uma entrevista coletiva para dizer que emitiu medida cautelar que obriga o Google a informar se tratar de uma publicidade o link que estava em sua página inicial com os dizeres “O PL das fake news pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”.
O link foi retirado do ar minutos após o anúncio de Dino.
No final da tarde, emissários do Planalto foram enviados à Câmara para solicitar o voto favorável da bancada do MDB. Parlamentares relataram ter havido pedido nesse sentido do presidente do partido, deputado Baleia Rossi, e da ministra Simone Tebet (Planejamento).
Integrantes do Podemos também disseram ter sido procurados por membros do governo, após apelos de Dino e do ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha.
Depois de Moraes determinar a tomada de depoimento dos executivos das empresas de tecnologia, Dino foi às redes sociais elogiar a decisão do ministro do STF e presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
“A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, fortalece a necessidade de uma internet que cumpra a Constituição e as leis. Não podemos mais conviver com faroeste cibernético”, afirmou.
Moraes já havia ido à Câmara apresentar sugestões ao projeto, cujo texto vem sendo alterado pelo relator, Orlando Silva (PC do B-SP).
Como mostrou a Folha, o Google lançou uma ofensiva como o PL das Fake News. Levantamento do NetLab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, sugere que a empresa tem privilegiado nos resultados de buscas sobre o projeto de lei conteúdo contrário a sua aprovação. Também tem publicado alerta no YouTube sobre “impacto negativo” para os criadores e enviado mensagens a youtubers a respeito.
O Google afirmou em nota que apoia as discussões de combate à desinformação. “Todos os brasileiros têm o direito de fazer parte dessa conversa e, por isso, estamos empenhados em comunicar as nossas preocupações sobre o Projeto de Lei 2630 de forma pública e transparente. Destacamos essas preocupações em campanhas de marketing em mídia tradicional e digital, incluindo em nossas plataformas.”
Já bolsonaristas e a bancada evangélica na Câmara fizeram protestos durante o dia e também afirmaram haver uma pressão forte do governo sobre parlamentares de partidos de centro e de direita.
“O texto está repleto de perseguições. Vocês, que são jornalistas, vão sentir isso na pele depois”, afirmou o presidente da bancada evangélica, Eli Borges (PL).
Por pressão de parlamentares evangélicos, o relator incluiu no projeto a garantia do “livre exercício da expressão e dos cultos religiosos, seja de forma presencial ou remota, e a exposição plena dos seus dogmas e livros sagrados”.
Apesar de a homofobia ser crime desde 2019, parte da bancada afirma que a proposta restringirá manifestações de religiosos que são contrários à homossexualidade.
A votação do PL das Fake News ganhou força no governo Lula após os ataques golpistas de 8 de janeiro e depois dos ataques a escolas em São Paulo e em Blumenau (SC).
O texto em discussão traz, entre outros pontos, uma série de obrigações às plataformas de redes sociais e aplicativos de mensagem, como a moderação de conteúdo.
O relatório estipula ainda que a imunidade parlamentar material prevista na Constituição se estende às redes sociais. Além disso, determina que contas de presidentes, governadores, prefeitos, ministros, secretários e outros cargos são consideradas de interesse público. A partir disso, proíbe que os detentores restrinjam a visualização de suas publicações por outros usuários.
Para as redes sociais há obrigações, por exemplo, de produção de relatórios de transparência e de identificação de todos os conteúdos impulsionados e publicitários.
*** Informações com ➡ Folha de S. Paulo
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