‘Morena’ e ‘macumbeira’: ex-patroas fazem ‘lista suja’ e orientam não contratar 134 empregadas no Ceará

NOTÍCIAS DO CEARÁ

“Golpista, articuladora, mentirosa, irresponsável, bipolar”, “é doida, não aceita ordens”, “mexe em tudo na casa”, “é morena, se envolve com péssimas companhias (traficantes)”, “descontrolada emocional”, “coloca a patroa na Justiça”, “macumbeira”, “tinha Tinder e outros aplicativos”,  “sai falando mal da patroa”, “é suja”, “furta”, “aprontou muitas”.

Esta é uma pequena amostra de frases utilizadas por ex-patroas em uma lista ilegal que circula em grupos de Whatsapp com “motivos” pelos quais recomendam a não contratação de domésticas, babás e cuidadoras em Fortaleza.

Atualizada com frequência, a “lista suja” expõe os nomes de mais de uma centena de trabalhadoras, juntamente com dados sensíveis como RG, CPF e até o nome da mãe, naturalidade e estado civil. A versão mais recente à qual o Diário do Nordeste teve acesso é da sexta-feira, 26 de maio, e reúne 134 nomes.

Acusações de golpes, maus-tratos e roubo dividem espaço com xingamentos e com a exposição de dados, de hábitos pessoais e de supostos antecedentes criminais, sem apresentar provas e invadindo a privacidade de ex-funcionárias. “Essas pessoas podem responder por calúnia e difamação”, afirmou, em entrevista ao Diário do Nordeste, a auditora fiscal do Trabalho, Alice Silva.

Antônio de Oliveira Lima, procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), classifica a construção desse tipo de lista como uma prática “inadmissível” e acrescenta que, comprovada a autoria, ela gera indenização por dano moral coletivo.

PREJUÍZOS DE ESTAR NUMA ‘LISTA SUJA’ 

Sem entrar no mérito das acusações feitas na lista, a auditora explica que o local certo para tomar uma atitude seria uma delegacia e não colocar num grupo do whatsapp. “Isso traz grandes prejuízos a essas trabalhadoras: uma coisa que pode nem ser verdade pode tirá-la do mercado de trabalho. É tirado o direito dessa pessoa de buscar um emprego”, explica.

O primeiro dano dessas “listas sujas” é à sobrevivência das trabalhadoras, complementa o procurador, por impactar na recolocação. Mas pode haver também impactos para a saúde mental quando ela se dá conta de que o próprio nome está circulando nos grupos de maneira negativa e não tem possibilidade de se defender. “A própria vida do empregado, a dignidade, está tudo em risco nessa prática.”

No meio disso, há ainda um rol de preconceitos destilados que não poupam sequer a liberdade religiosa das trabalhadoras. “Macumbeira”, aponta uma ex-patroa sobre uma funcionária, de forma pejorativa e logo após mencionar uma série de comportamentos indesejados.

Listas como esta são discriminatórias e ferem os direitos dessas trabalhadoras por utilizar critérios proibidos na legislação brasileira, afirma a doutora em Direito do Trabalho Ana Virginia Moreira Gomes, professora do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza (Unifor).

“Até a questão da cor apareceu. (Assim como) o fato de a pessoa ter entrado na Justiça do Trabalho, de ter respondido (à patroa), como se a trabalhadora não tivesse o direito de ter voz”, complementa.

BABÁS E DOMÉSTICAS DIFAMADAS PODEM BUSCAR MINISTÉRIO

Esse tipo de lista também existe em outros lugares. Na quinta-feira, 25 de maio, a Repórter Brasil publicou uma reportagem denunciando uma delas, que contava com conteúdo difamatório contra babás e empregadas domésticas que trabalharam em condomínios de luxo em São Paulo.

Nesse caso, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) realizou uma fiscalização em quatro condomínios, durante a qual foram feitas seis autuações trabalhistas. Ao Diário do Nordeste, a auditora fiscal do Trabalho Alice Silva afirmou que o mesmo poderia ser feito em Fortaleza, caso houvesse uma denúncia formal e fosse localizado de onde partiu a lista.

“O que foi feito em São Paulo e pode ser feito aqui, ao identificar o local, é fazer uma fiscalização nesse condomínio, com todos os moradores que possuam empregadas domésticas ou babás. É indício grande de que tem irregularidades”, afirma.

Legenda: O comportamento e a vida íntima das empregadas domésticas e babás são expostos na “lista suja”. “É algo impensado, por exemplo, em um ambiente empresarial”, afirma a doutora em Direito do Trabalho Ana Virginia Moreira Gomes

Não se sabe a origem da lista que circula em grupos de patroas no Ceará, com centenas de participantes que não necessariamente moram num mesmo condomínio. Mas a auditora destaca que as trabalhadoras que forem inseridas na “lista suja” podem procurar o Ministério do Trabalho.

“É muito importante a união das trabalhadoras na unidade sindical, para ficarem mais fortes e podem procurar a Justiça no caso de calúnia e difamação, além de indenização”, reforça.

“É A FORÇA DE TRABALHO DE UM TRABALHADOR”

Com 5,8 milhões de pessoas empregadas no trabalho doméstico, a categoria representa 5,9% de toda a população ocupada no Brasil, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no último trimestre de 2022. Esse trabalho é majoritariamente exercido por mulheres, que equivale a 91,4% da classe.

Apesar de a categoria ser expressiva no Brasil, o serviço doméstico não é percebido socialmente como as outras profissões, e esses profissionais não são vistos como detentores de direitos tanto quanto os demais. Entre as reclamações das ex-patroas, a funcionária ter acionado o Poder Judiciário em busca de direitos trabalhistas é um argumento que se repete.

“‘Fala muito, gosta de conversar, usa o Tinder, tem um namorado’. É uma violação da privacidade. Elas têm que ter o poder de decidir quando, como e se toda essa informação sobre elas vai ser utilizada. (…) É algo impensado, por exemplo, em um ambiente empresarial”, afirma Ana Virginia Moreira Gomes.

Já faz dez anos, porém, que alguns dos direitos dos demais profissionais foram estendidos a essa categoria. Limitação da jornada de trabalho, recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e indenização em caso de dispensa sem justa causa foram algumas das conquistas da PEC das Domésticas, como ficou conhecida a Emenda Constitucional nº 72/2013.

Na avaliação do procurador Antônio de Oliveira Lima, com a PEC das Domésticas, houve avanços em termos de legislação, mas não na prática e na efetivação desses direitos. “Nossa sociedade ainda é muito omissa em relação à garantia de cidadania a todas as pessoas, especialmente aos empregados domésticos, em que ainda existe muita discriminação em relação a essa categoria”, afirma.

No mesmo sentido, a auditora fiscal do trabalho Alice Silva afirma que é necessário avançar, enquanto sociedade, e entender que o trabalho doméstico “é como qualquer outro”. “Há esse aspecto cultural ligado ao tempo da escravidão de que você tem que ter uma pessoa pra tomar conta da sua casa e de você, e coloca isso como trabalho menor. Mas é a força de trabalho de um trabalhador”.

Para que as condições do trabalho doméstico sejam melhoradas, Ana Virginia Moreira Gomes defende que seja repensado o valor do cuidado. “É sempre uma questão de mulheres — as empregadoras e as trabalhadoras — mas não deveria ser. Ela é essencial para todo mundo.”

Além disso, a professora afirma que, quando esse trabalho é realizado informalmente, em um contexto precário e com baixa remuneração, essas trabalhadoras tendem a ser menos profissionalizadas.

Assim, ela destaca a importância de um sistema formal de cuidado. “As famílias deveriam ter interesse nessa qualificação. São pessoas que vão fazer trabalhos muito importantes”, afirma. E os meios para se escolher uma profissional para trabalhar em casa incluem entrevista e período de experiência, por exemplo, mas não uma “lista suja”.

Listas sujas de trabalhadores são ilegais

Desde 2003, o Governo Federal publica uma “lista suja” dos empregadores que submetem trabalhadores a condições análogas à escravidão. Ao contrário daquelas que circulam por grupos de WhatsApp, essa produzida pelo Ministério do Trabalho e Previdência (MTP) é legal, prevista na Portaria Interministerial MTPS/MMIRDH nº 4 de 11 de maio de 2016.

O nome e o respectivo CNPJ — ou CPF — do empregador só é inserido após a conclusão do processo administrativo que julga o auto de trabalho escravo específico. O infrator permanece no documento por dois anos.

“Não é simplesmente exposto, é preciso um processo administrativo. A lista suja das trabalhadoras domésticas é totalmente ilegal, não passa por nenhum tipo de processo administrativo ou investigação”, diferencia a auditora fiscal do Trabalho Alice Silva.

A lista suja do trabalho escravo, como é conhecida, é “uma medida de ‘vergonha’ para afetar a reputação das empresas” e para evitar um crime, pontua a doutora em Direito do Trabalho Ana Virginia Moreira Gomes. “É muito diferente da elaboração de uma lista fundada em critérios discriminatórios”, complementa.

Tanto essas listas são ilegais que, em 2014, o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) aprovou a resolução nº 139 de 24 de junho de 2014, que conta com medidas que os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) devem adotar para impedir ou dificultar o acesso automático ao nome dos empregados que constam em processos judiciais no âmbito trabalhista. O objetivo é justamente evitar a elaboração de “listas sujas” de trabalhadores que reivindicam os próprios direitos.

O procurador do Ministério Público do Trabalho Antônio de Oliveira Lima explica que, antes, era possível realizar pesquisas por processos pelo nome dos funcionários. Quando começaram a surgir denúncias de criação de “listas sujas” por parte de empresas, essas pesquisas passaram a ser proibidas e agora só quem tem o número do processo consegue acessá-lo.

Já as listas compartilhadas em WhatsApp são práticas “relativamente novas”. Mesmo que elas circulem em grupos fechados, caso essas empregadoras sejam identificadas, segundo o promotor, uma ação de reparação por danos morais por ser imputada elas por compartilhar informações que atingem a imagem das ex-funcionárias.

“Assim como também está proibido por lei que o empregador faça qualquer anotação na carteira de trabalho que possa atingir a imagem do empregado: o motivo da demissão ou qualquer fato que tenha acontecido na relação de trabalho”, complementa.

*** Informações com ➡ Diário do Nordeste

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