Edição: Geisa Marques (Brasil de Fato)
O hacker Walter Delgatti Neto afirmou que o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira facilitou o acesso à sede da pasta, em Brasília, e aos funcionários especialistas em tecnologia da informação para tentar criar um código-fonte falso das urnas eletrônicas a fim de fraudar as eleições presidenciais de 2022.
A ponte entre Paulo Sérgio Nogueira e Walter Delgatti Neto teria sido feita pelo próprio ex-presidente Jair Bolsonaro após uma reunião no Palácio do Alvorada, que teria ocorrido em 10 de agosto do ano passado. Na ocasião, segundo o hacker, estavam presentes Bolsonaro, a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP), o ex-ajudante de ordens Mauro Cid e o assessor da Presidência Marcelo Câmara.
“A conversa foi bem técnica até que o presidente me disse: a parte técnica eu não entendo, vou te enviar para o Ministério da Defesa, por meio do general Marcelo Câmara, e lá você explica, a despeito da resistência de Marcelo Câmara em levá-lo”, disse Walter Delgatti Neto aos parlamentares da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), que apura os atos golpistas de 8 de janeiro, nesta quinta-feira (17).
“Ele me disse que eu estaria salvando o Brasil. Nisso essa conversa foi evoluindo e chegou na parte técnica. Recebi garantia de proteção, receberia um indulto do presidente. Com as cautelares de proibição de acessar a internet que eu tinha, foi oferecido esse indulto.”
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No total, o hacker afirmou que foi ao Ministério da Defesa cinco vezes em encontros com o ex-ministro Paulo Sérgio Nogueira e com o pessoal de tecnologia de informação. “Eles iam até o TSE [Tribunal Superior Eleitoral] e me passavam o que viam. Eles meio que iam decorando o que viam do código e me passavam, e eu ia passando orientações”, detalhou.
Inclusive, o relatório que foi entregue ao TSE pelo Ministério da Defesa, em 9 de novembro do ano passado, foi elaborado com base nas informações prestadas por Walter Delgatti Neto. O documento aponta para dois pontos de atenção em relação às urnas eletrônicas, mas comprova que não houve fraude nas eleições de 2022.
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O relatório, a despeito de ter sido elaborado com o apoio de Walter Delgatti Neto, não conseguiu falsear uma falha. Isso porque as urnas só poderiam ser fraudadas se funcionassem online. Os aparelhos, no entanto, só funcionam offline. “Isso seria uma fantasia, tanto que lhe foi pedido que fosse um código-fonte falso”, disse a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) durante o depoimento desta quinta-feira (17). Em resposta, o hacker disse: “concordo”.
“Ele sabia que a urna é o meio adequado para a eleição, não à toa ele teve vários mandatos. Insatisfeito, ele queria demonstrar que a urna poderia ser fraudada, mas esqueceu que a urna é offline. Se é offline, você não poderia fraudar. Só poderia fraudar se fosse online”, disse o deputado Duarte Jr. (PSB-MA), na mesma linha, ao que Delgatti confirmou as informações: “correto”.
“Mas Jair Bolsonaro, ainda assim, chamou o ex-ministro da Defesa para lhe dar todas a condições e caminhos para ter contato com os técnicos para que o senhor pudesse fraudar as eleições. Confirma?”, perguntou o deputado, que teve a confirmação do hacker.
“O senhor sabia que estava fazendo coisas erradas?”, questiona novamente Duarte Jr., obtendo, mais uma vez, resposta positiva de Delgatti: “sabia, mas lembrando que estava fazendo a pedido de um presidente. Ele me deu dar carta branca para fazer o que quisesse em relação às urnas, que eu seria anistiado”, concluiu o hacker.
“Isso é gravíssimo. O pedido para fraudar a eleição foi feito por um presidente em seu mandato”, condenou o deputado do PSB.
Grampo de Moraes
O hacker Walter Delgatti Neto também afirmou que Jair Bolsonaro pediu que ele assumisse um grampo que teria sido feito contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), durante uma ligação mediada pela deputada federal Carla Zambelli (PL-SP).
“O presidente entrou em contato comigo por meio de um celular aparentemente novo, com um chip inserido naquela hora. Eles haviam conseguido um grampo do ministro Alexandre de Moraes, que teria conversas comprometedoras, e eles precisavam que eu assumisse a autoria desse grampo”, disse.
A ligação teria ocorrido em um posto de gasolina, próximo a Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Pouco antes, Zambelli teria ligado para Walter Delgatti Neto e falou que precisava tratar de um assunto urgente. Logo depois, um motorista da parlamentar teria buscado o hacker para levá-lo até o local.
“Esse grampo seria suficiente para uma ação contra o ministro e refazer as eleições. Eu concordei em assumir porque era uma proposta do presidente da República. Depois a Carla Zambelli disse que seria necessário invadir alguns sistemas de Justiça para demonstrar a fragilidade dos sistemas, a pedido de Bolsonaro”, disse Delgatti.
Foi neste momento que o hacker teria feito a inserção de alvarás de soltura e um mandado de prisão contra o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes no Banco Nacional de Monitoramento de Prisões do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). As inserções foram feitas entre 4 e 6 de janeiro deste ano, dias antes dos atos que culminaram na invasão e depredação dos prédios dos Três Poderes, em Brasília.
Em 27 de junho deste ano, Delgatti confessou à PF a sua participação em parte do esquema, que teria contado com a ajuda da deputada federal bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP). O hacker afirmou que o objetivo da invasão era expor as vulnerabilidades do sistema judiciário brasileiro, com o propósito de desacreditar o sistema eletrônico de votação.
Segundo Delgatti, Zambelli solicitou que, caso não conseguisse invadir as urnas eletrônicas, o hacker deveria procurar por “diálogos comprometedores” envolvendo Alexandre de Moraes. Em resposta, Delgatti teria afirmado que seria possível inserir um mandado de prisão contra o ministro no sistema do CNJ.
Zambelli teria feito o texto e enviado para publicação. Delgatti alegou que “fez algumas alterações, pois o português estava meio ruim”, e emitiu o mandado de prisão e o bloqueio de valores, no exato valor da multa aplicada ao PL pelo TSE, de cerca de R$ 22 milhões.
A defesa de Zambelli disse que ela “rechaça qualquer acusação de prática de conduta ilícita e imoral pela parlamentar, inclusive, negando qualquer tipo de pagamento ao mencionado hacker”. Segundo Delgatti, a ex-deputada depositou cerca de R$ 40 mil em sua conta.
Reunião de 9 de agosto
Um dia antes de Bolsonaro encaminhar o hacker ao Ministério da Defesa, em 9 de agosto, teria havido outra reunião. Na ocasião, o marqueteiro de Jair Bolsonaro, Duda Lima, teria sugerido a Walter Delgatti Neto a apresentação da suposta fraude às urnas eletrônicas à população no dia 7 de setembro ou em uma propaganda eleitoral.
“O Duda Lima, inicialmente, disse que seria ideal eu participar de uma entrevista com a esquerda e falar de forma espontânea sobre a fragilidade das urnas. Não ocorreu porque o meu encontro saiu na mídia, e eles cancelaram esse plano. Uma segunda ideia era pegar uma urna emprestada da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil], fazer um código meu, em vez do código do TSE, e mostrar que é possível apertar um voto e imprimir outro”, disse Delgatti à CPMI.
“Eles queriam que eu fizesse um código-fonte fake e inserisse nas linhas que se chamam ‘códigos maliciosos’. Isso seria divulgado no 7 de setembro ou em alguma propaganda eleitoral”, afirmou.
*** Informações com ➡ Brasil de Fatos
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