Por Thaís Brito (G1-Ceará)
Oficialmente, os meses de chuva no Ceará não são chamados de inverno. Mas inverno é palavra entranhada no coração e na fala do sertanejo. Ela se destaca também nos versos de Patativa do Assaré, que cantou sobre uma terra marcada pelas grandes secas. De tão desejado, o período passou a ser também profetizado pelos agricultores que se atentam aos sinais da natureza.
Os profetas da chuva observam diversos elementos que podem anunciar a chegada das chuvas: as formigas, as borboletas, os ventos, algumas aves e plantas.
Há 28 anos, eles se reúnem na cidade de Quixadá para partilhar previsões para a próxima quadra chuvosa. O Encontro dos Profetas da Chuva é realizado no segundo sábado de janeiro. No evento, os profetas são inicialmente recebidos com aplausos, em momento de reverência às tradições que eles preservam.
Neste ano, o evento acontece no dia 13 de janeiro a partir das 9h, na sede do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFCE) Campus Quixadá.
O encontro é uma forma de perpetuar o costume de se encontrar nas casas dos fazendeiros para prever o ciclo seguinte de chuvas, explica o profeta João Soares, que é um dos organizadores. O grupo que tem se reunido nos últimos anos conta com as experiências de quase 30 profetas da chuva.
(..) “O momento é de mostrar as experiências que aprendemos com os nossos avôs, nossos pais, com as pessoas mais antigas. E estes profetas estão trazendo as mesmas experiências dos antigos”, conta João Soares.
Aos 83 anos, João mora em Quixadá e costuma fazer duas experiências para identificar se vai chover no ano seguinte. Uma é a experiência com a água abaixo da fogueira de São João, ainda no período junino. A outra é com as pedras de sal no dia dedicado a Santa Luzia.
Conheça alguns sinais observados pelos profetas da chuva:
- ➡ O comportamento das formigas: o sertanejo percebe que tem chuva se aproximando quando as formigas passam a limpar o formigueiro, retirando a comida velha e levando comida fresca para dentro. O sinal é de que elas estão se preparando para o período de chuvas.
- ➡ As pedras de Santa Luzia: o experimento é feito no dia 13 de dezembro, dedicado à santa. Seis pedras ou montinhos de sal são deixados na janela para virar a noite, cada um representando um mês do primeiro semestre. No dia seguinte, as pedras que amanheceram mais úmidas indicam os meses que terão chuvas. As pedras secas equivalem aos meses sem boas chuvas.
- ➡ A fogueira de São João: nos festejos juninos, uma garrafa com água é colocada em um buraco cavado abaixo da fogueira. Dois ou três dias depois de apagada a fogueira, o sertanejo confere como ficou a garrafa. Se ela estiver vazia, o inverno será ruim. Se estiver com muita água, é sinal de muita chuva no próximo ciclo.
- ➡ A reprodução dos cupins: quando os cupins aumentam a produção de larvas em sua casa e criam asas para voar, o sertanejo entende que tem chuva se aproximando.
- ➡ A casa do joão-de-barro: se o pássaro construir o ninho com a entrada virada para o sol nascente, é sinal de que não vai ter chuva. Isso porque o joão-de-barro consegue identificar a direção dos ventos e constrói o ninho na direção contrária às chuvas.
- ➡ O dia de São José: a data de homenagem ao padroeiro do Ceará, celebrada a 19 de março, é próxima ao equinócio que marca a passagem do verão para o outono. O contexto do equinócio de outono pode atrair ventos úmidos e chuvas para o Nordeste brasileiro. Na crença popular, ter chuva até o dia de São José significa que o resto da quadra chuvosa será boa.
Além dos moradores de Quixadá, o encontro recebe também profetas de outras regiões, como do Maciço de Baturité e do Sertão dos Inhamuns.
A programação cultural com o tema dos profetas da chuva vai até o mês de junho, com seminário, exibição de filmes e shows musicais, com eventos promovidos pela Prefeitura de Quixadá e diversos parceiros, como o Ministério da Cultura e o Instituto de Pesquisa de Violas e Poesia Cultural Popular do Sertão Central.
A espera pelo bom inverno
O calendário cultural do Sertão Central é iniciado com o encontro dos profetas. As experiências trazidas pelos participantes, que construíram uma relação mais íntima com os ciclos da natureza, vêm de uma tradição secular e que pode se enfraquecer pelo desinteresse das novas gerações, comenta Clébio Viriato Ribeiro, secretário da Cultura em Quixadá.
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*** Informações com ➡ G1 Ceará
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