Angela Pinho (SÃO PAULO) – O material sobre rádios enviado pela campanha de Jair Bolsonaro (PL) ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), da forma como foi apresentado, não comprova a alegação de prejuízo ao presidente nas inserções da propaganda eleitoral no rádio. A fragilidade se deve principalmente à forma de análise da programação.
A empresa que fez o monitoramento para a campanha de Bolsonaro afirma realizar o monitoramento das transmissões divulgadas pelas emissoras por streaming. O problema é que, nessa modalidade, a veiculação da propaganda política não é obrigatória.
Da mesma forma que acontece, por exemplo, com a Voz do Brasil, as empresas de rádio podem veicular outros conteúdos pela internet durante o horário eleitoral, afirmam especialistas.
Na manhã desta quarta-feira (26), Bolsonaro usou o tema para insinuar que poderá não aceitar o resultado da eleição no próximo domingo.
“O que foi feito, comprovado por nós, pela nossa equipe técnica, é interferência, é manipulação de resultados. Eleições têm que ser respeitadas, mas, lamentavelmente, PT e TSE têm muito o que explicar nesse caso”, declarou.
Bolsonaro, que aparece atrás do ex-presidente Lula (PT) nas pesquisas eleitorais, responsabilizou diretamente o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), já alvo do presidente em suas mentiras e afirmações sem provas e indícios acerca das urnas eletrônicas e de todo o sistema de votação.
Na noite desta terça-feira (26), após o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, exigir indicação de rádios, dias e horários em que não teriam sido veiculadas as inserções no Norte e Nordeste, a coligação protocolou representação com oito exemplos de emissoras da Bahia e de Pernambuco que teriam desfavorecido Bolsonaro com menos inserções.
Foram enviados ao tribunal também arquivos com dados brutos de outras emissoras, analisados pela empresa Audiency Brasil Tecnologia. Segundo o Ministério das Comunicações, o Brasil tem ao todo 10.176 outorgas de rádio —entre elas, 4.746 comunitárias, 4.129 FM e 1.115 AM.
Ao descrever a metodologia do levantamento, a empresa afirma que é criado “um algoritmo/código, que captura o áudio emitido em tempo real pelo streaming público das emissoras, transforma-os em dados binários e processa os arquivos binários comparando-os com áudios cadastrados no banco de dados da plataforma por espelhamento”.
Ou seja, a base é o streaming.
O problema é que, além de emissoras de televisão e rádio não serem obrigadas a transmitir a propaganda eleitoral por streaming, a análise automatizada tem outras fragilidades.
Profissionais de rádio e de empresas de monitoramento ouvidos pela Folha afirmam serem comuns falhas na transmissão online. Se parte da transmissão diária de uma emissora não entrar no streaming, ficará de fora de um monitoramento feito dessa forma.
É por isso que, segundo advogados eleitorais, campanhas costumam fazer o monitoramento por amostragem. É um sistema caro, uma vez que exige a captação do sinal pela onda do rádio no local de transmissão e a análise dos dados por pessoas contratadas.
MÉTODOS DE CHECAGEM
A checagem das inserções, seja na propaganda política, seja na propaganda privada, em geral é feita de três formas, segundo Luís Cláudio Garrido, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Monitoramento de Informação (Abemo).
Uma delas é a manual, ou seja, com pessoas na radioescuta que anotam e transcrevem as propagandas e verificam o cumprimento de outras exigências, como o horário de exibição e os intervalos.
Na propaganda eleitoral, por exemplo, as inserções não devem ser exibidas em um bloco único, mas distribuídas na programação.
Outra forma de monitoramento adotada pelo setor é a automatizada. Nessa metodologia, o anunciante envia a mídia, e o sistema a procura na programação das rádios, usando uma tecnologia de reconhecimento semelhante à do aplicativo Shazam, que consegue identificar uma música que esteja tocando no rádio.
Outro grupo grande de empresas usa uma combinação dos dois métodos, segundo Garrido: o digital para ter maior agilidade, e a presença humana para checar discrepâncias.
Advogados da área de direito eleitoral afirmam que não é incomum que os monitoramentos encontrem falhas pontuais na transmissão de inserções, seja na quantidade veiculada, seja na ordem delas.
O que não é usual, afirmam, é uma campanha relatar a poucos dias das eleições um problema dessa magnitude ocorrido semanas antes.
Caso seja observado algum erro, a praxe é informar o Tribunal Regional Eleitoral em até 48 horas, e a compensação é feita nos dias seguintes, afirma o advogado Francisco Octávio de Almeida Prado Filho.
Também advogado da área eleitoral, Ricardo Penteado ressalta que, mesmo que a análise tivesse sido feita pelo conteúdo transmitido via antena, a simples representação ao TSE não bastaria para comprovar a alegação de que as inserções não foram veiculadas.
“É preciso trazer a gravação da programação inteira de cada emissora para que seja feita perícia”, afirma.
Ele ressalta ainda que seria preciso analisar se as inserções de Lula também não deixaram de ser exibidas. Divulgar mesmo no streaming apenas as inserções de um candidato seria irregular, na avaliação do advogado, uma vez que poderia caracterizar propaganda desequilibrada.
Profissionais do setor de radiodifusão afirmam, sob condição de anonimato, que, devido à grande quantidade de rádios pequenas, com pouca estrutura de pessoal, e à dificuldade de uma fiscalização abrangente, é de fato possível que em algumas localidades não sejam respeitadas as regras de inserção, o que poderia prejudicar em tese tanto Bolsonaro como Lula.
Atualmente, as campanhas enviam as mídias de propaganda a um pool de emissoras que tem uma sala no TSE, e cada emissora pode baixar as mídias para inserir na sua programação.
*** Informações com ➡ FOLHA DE S. PAULO
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