Professor da USP explica por que tese golpista do PL sobre as urnas não tem base técnica

VARIEDADES

O pedido do PL, de Jair Bolsonaro, para o Tribunal Superior Eleitoral invalidar os votos computados em 279 mil urnas no segundo turno da eleição presidencial não tem sentido do ponto de vista técnico, explicou a CartaCapital nesta terça-feira 22 Marcos Simplício, professor e pesquisador do Departamento de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais da Escola Politécnica da USP.

Em resumo, a legenda afirma ter contratado um estudo que apontou possíveis irregularidades em modelos de urnas anteriores a 2020. O argumento central é de que os logs das urnas teriam apresentado um “número inválido” em uma das colunas da tabela produzida pelo Instituto Voto Legal, o que seria “um indício muito forte de falha da urna, porque é impossível associar o registro de cada atividade ao equipamento físico”.

Simplício explicou que o log é um dos identificadores do processo, mas não o único ou o mais importante. Trata-se de algo semelhante a um diário de bordo: ele registra o que acontece na urna, e cada linha teria o seu identificador. Nesse arquivo específico de log, não há o identificador das urnas anteriores a 2020.

“A conclusão deles é que não seria possível saber se aquele log veio de fato da urna, o que está errado. Esse não é o único identificador. Do próprio log você consegue extrair outros dois identificadores: a zona (seção) e o local de votação. E há outro código, chamado de código de correspondência da urna, que também é único por urna”, disse o professor.

Eis uma analogia oferecida pelo especialista: a alegação do PL se assemelha a uma tentativa de afirmar que não poderia ser identificada uma pessoa que forneceu os números de CPF e RG, mas cujo registro no INSS apresenta os mesmos dados de outros cidadãos. Bastaria, acrescentou o professor, não se basear no INSS e levar em conta o CPF e o RG.

Além disso, as informações que o PL sugere não constarem dos logs estão em outros documentos, mais importantes, a exemplo dos votos correspondentes. Lá, diz o professor, está o identificador correto. Em suma, o log não é a principal forma de identificar as informações nessas urnas.

“A principal delas não é nenhum dado que está dentro do próprio log, é a assinatura digital feita pela urna. Essa, sim, é a prova de que aquele documento foi gerado pela urna. Se ele está assinado digitalmente por aquela urna, só aquela urna conseguiria gerar aquele documento.”

Especialistas da USP – inclusive Marcos Simplício – tentaram, no âmbito de testes com as urnas, gerar documentos falsos nos equipamentos, mas não conseguiram. Justamente porque a assinatura digital é o que de fato garante a autenticidade de um log.

Na ação levada ao TSE, o PL não questiona os dados do primeiro turno, que deram ao partido a maior bancada na Câmara dos Deputados, com 99 eleitos. Também não coloca em xeque resultados significativos em disputas estaduais, como em São Paulo, onde Tarcísio de Freitas (Republicanos) – apoiado pela sigla bolsonarista – foi eleito governador.

O professor afirmou não haver qualquer justificativa técnica para a legenda alegar erros apenas no segundo turno da eleição presidencial.

“Vamos supor que haja um erro grave – não há, mas vamos supor, pelo argumento. O erro aconteceu no primeiro e no segundo turnos e para todas as instâncias: presidente, deputado, você vota tudo junto. Então, tecnicamente não tem nenhum motivo.”

Minutos depois de o PL protocolar sua representação no TSE, o presidente da Corte, Alexandre de Moraes, emitiu um despacho no qual afirma que “as urnas eletrônicas apontadas na petição inicial foram utilizadas tanto no primeiro turno, quanto no segundo turno das eleições de 2022”.

“Assim”, prosseguiu o magistrado, “sob pena de indeferimento da inicial, deve a autora aditar a petição inicial para que o pedido abranja ambos os turnos das eleições, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas”.

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